Porque você estima?
For me, estimation is valuable when it helps you make a significant decision.
Martin Fowler, “Purpose of Estimation“, in “How do you estimate on an Agile project“, Thoughtworks, 2013
Espero que não seja, como brinco muitas vezes, para fins quase malignos. As estimativas servem, não com pouca frequência, para todo o tipo de desrespeito às pessoas.
Conheci uma vez a Tannen Corp. Nome fictício de uma empresa que definia datas na mesa de negócios, usando estimativas feitas por pessoas que nunca participam do desenvolvimento, baseados em comparações com projetos anteriores e informações de alto nível. Quando a data não era atendida (o que já era esperado por todos), estas mesmas pessoas comentavam “não fui eu que errei a data, vocês que erraram a implementação”. Isso era levado tão a sério que, independente de todas as complexidades encontradas no desenvolvimento de produtos, as pessoas abandonavam seus compromissos pessoais e trabalhavam muitas horas a mais no desenvolvimento, simplesmente para atender uma data fictícia que atendia à estimativa original.
Parece anedótico, mas é muito comum esse tipo de comportamento. O que leva as pessoas a fazerem isso? Comumente, é por não entenderem o propósito da estimativa – uma característica de baixa maturidade organizacional.
Propósito das estimativas
Para entender o propósito das estimativas, vamos primeiro entender para o que não servem:
Dizer quando você deve acabar sua tarefa. Isso é um completo mito. Você acaba…. quando acaba. Como as estimativas são otimistas, pois as pessoas são pressionadas para encaixa-las em um prazo ou custo reduzido, gera trabalho extra, incompleto, com baixa qualidade ou não inspecionado – ou, ainda, a uma mistura de todos eles;
Comparar desempenho de times. A única medida para verificar o desempenho é se ele está ajudando o seu negócio – tais como demanda, capacidade de entrega, satisfação do cliente e finanças. #ficaadica: É possível um time desenvolver dentro das estimativas coisas que não vão ajudar o negócio.
Reduzir riscos. Embora, algumas vezes, estimar leve à visualização de riscos, não é esse seu principal objetivo, e existem práticas melhores para reduzir o risco.
Ser tão rápido quanto possível. Se existe um bug impedindo o uso do aplicativo, porquê você deveria esperar por uma uma estimativa para corrigi-lo?
Mas quando as estimativas brilham? Quando ajudam a escolher o melhor caminho. Exemplos:
Se temos vários objetivos de negócio competindo pelos recursos da empresa, em qual focamos? Podemos estimar para entender qual nos dará o melhor retorno em menor tempo.
Como coordenar esforços quando existem grandes dependências? Tendo ideia de quando a maior parte fica pronta, podemos tentar po stergar o início das menores.
E quando falamos deste tipo de tomada de decisão, não podemos considerar apenas estimativas de esforço e custo, mas também de retorno do investimento.
Estimando sem desperdício
Para um time que lança rapidamente novos produtos no mercado, estimar pode ser um desperdício. Para estimar bem é necessário detalhar e investir um grande tempo, e mesmo assim pode não ser suficiente. Aprendi com o tempo que se, ao invés disso, investir meu tempo encontrando o MVP, eu tenho uma grande vantagem competitiva sobre os que estão estimando e negociando cada item. O MVP é, simplificando, o que se acredita ser o menor esforço para atender um objetivo de negócio.
“Ah, mas encontrar o MVP passa por algum tipo de estimativa”, você poderia argumentar. E isso é verdade, no sentido de que quebramos as demandas em itens com tamanhos adequados para o nosso processo. Um item está adequado quando gera feedback aceitável para as partes interessadas em pouco tempo. O ideal é que as pessoas tenham feedback uteis para dar todos os dias, com sensação real de progressão.
Embora isso não seja possível sempre, ter isso como orientação ajuda muito a criar a sensação de fluxo de entrega, reduz a necessidade de trocar tarefas, permite adaptar mais rapidamente aos imprevistos e pulveriza o efeito dos riscos. Encontre a melhor maneira e momento para quebrar as suas demandas em itens de tamanho adequado, que ajudam a expor os riscos – pode ser o suficiente para resolver o seu problema!
Dica 1
Deixe o objetivo da entrega claro e o escopo aberto, para que o time tenha a liberdade de propor mudanças e comunicar imprevistos o quanto antes. Mantenha este escopo visível para todos os interessados, idealmente em diferentes níveis de detalhes!
Dica 2
Visualize o fluxo de trabalho através de um Kanban. Extraia forma consistente métricas sobre este fluxo e sobre o resultado do negócio. Incentive seu time a utilizar estes dados ao tomar decisões sobre como atingir um objetivo rapidamente, e você verá a maturidade subir rapidamente.
Neste ponto, os dias de perguntar aos desenvolvedores “quanto tempo leva” estarão contados. Se as datas críticas estiverem visíveis para todos, seu time saberá se organizar e alinhar com os interessados para fazer a melhor entrega possível.
Dica 3
Fique ligado no fluxo de serviço atual em busca de gargalos. Tente entender se as entregas atuais estão mais lentas que outras do do histórico recente, e converse com a equipe para agir. Veja que para isso não há estimativa envolvida.
Evoluindo a maturidade
Atingir a maturidade discutida acima leva tempo! Deixar de pedir estimativas aos especialistas não é recomendado de imediato na maioria das situações. Companhias com baixo nível de confiança entre os colaboradores podem estar presas em estimativas (em horas!) de especialistas porque não confiam que o seu profissional é capaz e ético, embora acreditem que ele é importante para o seu negócio. Para mudar isso, é mais fácil passar por um ponto intermediário, onde alguma técnica de estimativa de tamanho (APF, tamanho de camiseta, story points) é utilizada como referência de velocidade, enquanto um coach trabalha a questão de confiança entre as pessoas, para fortalecer o sistema de trabalho ao invés do microgerenciamento de cada indivíduo envolvido.
Quando há confiança de que os envolvidos na entrega do serviço são éticos e capazes, utilize métricas comparativas para mostrar que a diferença de tempo de entrega de um item estimado como “pequeno” e outro como “grande” é negligenciável, desde que nenhum item seja grande demais. Então alguma técnica como a simples contagem de itens pode ser suficiente!
Conclusão
Estimar pode ser muito importante, desde que pelos motivos certos. Se você quer promover uma mudança ágil, quer ser Lean, quaisquer que sejam os valores da sua empresa, procure valorizar ao seu redor tomadas de decisão eficazes e eficientes, baseadas em dados, envolvendo as pessoas que participam de fato do desenvolvimento do produto. Desta forma, estimar pelos motivos certo se tornará um hábito, feito com um método adequado à maturidade da organização.
Se não, você pocê pode acabar patrocinando a aparição de líderes como o da Tannen Corp, que desrespeitam as pessoas e cujas estimativas não servem para orientar o negócio. O que você quer patrocinar?